A revista Veja usou de
ironia e mentiu. Quem garante que a Veja não recebera dinheiro da indústria das
armas para defender o "não"? Quem garante que a reportagem de capa do
"não" não tenha sido uma jogada de marketing? Embora a lei vigente
permita que revista e jornais impressos possam se manifestar, a Veja cometeu um
grande erro ao tentar influenciar, pois deveria apenas informar.
A Campanha do
"sim" começou tímida e de ambos os lados está fraca e não está muito
informativa e esclarecedora. Por outro lado, as emissoras televisivas não estão
cumprindo o seu papel de informar convenientemente os telespectadores (art. 221
da Constituição Federal). A televisão e as rádios estão proibidas de se
posicionar a favor do "sim" ou do "não".
Segundo entendimento do
TSE (Tribunal Superior Eleitoral), se assim não fosse, estas poderiam
influenciar a opinião de 70 milhões de eleitores semi-alfabetizados. Se
permitisse as emissoras se posicionarem, teria uma guerra em torno do assunto
que possibilitaria um maior ganho para o povo e não restando assim espaço para
essa coisa morna, quase morta.
Até porque a maioria do
povo se informa através da televisão e quase todos têm o aparelho em casa.
Equivocou-se o TSE ao restringir as emissoras de rádio e tevê. Ainda são
necessários mais debates (a "poderosa" Globo ainda não se
manifestou), mais esclarecimentos sobre o Referendo e o Estatuto porque as
pessoas confundem ambos.
Quando falamos em
desarmamento, já o temos pré-estabelecido desde o vigor da lei 10.826 em 22 de
dezembro de 2003, pois se olharmos para os artigos 4.º, 6.º e 10.º vamos notar
quem poderá ter posse e porte de armas é um rol muito restrito de pessoas (ver:
Decreto 5.123). As armas ilícitas têm de ser devolvidas obrigatoriamente, mas
aquelas devidamente registradas e compradas (direito adquirido/ato jurídico
perfeito) pelo "cidadão de bem", não é obrigatória sua devolução, e
sim a transferência de registro estadual para federal.
No Brasil, há um problema
seriíssimo que nos afeta, que é a lei considerada avançada, mas que não
funciona porque não há fiscalização e seriedade, daí, então, a falta de
credibilidade dos governos. Para se comprar uma arma hoje é necessário ter o
curso de tiro.
Há muitas confusões que
ainda permeiam o imaginário das pessoas, por exemplo: o Estado pode tirar o meu
direito de defesa? Se o "sim" vencer onde se comprará munições nos
casos permitidos por lei? Este será regulamentado por lei. A quantidade de
munição que cada pessoa poderá ter é atribuição do Exército.
A Adepol (Associação dos
Delegados de Polícia) entrou com ação no Supremo Tribunal Federal alegando
inconstitucionalidade do referendo. O que inexiste é inconstitucionalidade e
vão amargar essa derrota. Agora é estranho que a mesma polícia que diz
"Nunca reaja a um assalto" vem, posteriormente, defender o uso de
armas por civis. É paradoxal ter arma, mas não poder usar num assalto.
Num país onde as armas
matam mais que acidente de trânsito, é importantíssimo que o Estado legisle
sobre o direito de ter armas com prioridade ao direito de o cidadão ter à vida.
Se a proibição não ajuda resolver parte do problema, então, que tal legalizar o
estupro, as drogas, o aborto, a prostituição, a corrupção, o tráfico de órgãos,
de crianças, de animais. Um pouco de paternalismo não faz mal.
O Estado tem o direito de
resguardar a vida como fez com a obrigatoriedade do uso do cinto de segurança,
da regulamentação da velocidade nas pistas por entender que o direito de ter um
carro e o direito de usufruir de toda potência do motor colocaria em risco a
vida do condutor e de outras pessoas.
Hoje na Grã-Bretanha é
necessário apresentar uma boa razão, como estar associado a um clube de tiro,
para ter direito à posse da arma, pois a simples alegação de autodefesa desde
1967 não convence.
Vale lembrar que o
argumento usado pelo "não" de que a briga do bar não envolve a posse
de arma e sim o porte (proibido para a maioria) é uma meia-mentira travestida
de meia-verdade, pois quem tem a posse e perde a cabeça vai até em casa e
depois retorna armado para matar o outro. É claro também que quem tem armas em
casa acaba distribuindo gratuitamente aos bandidos numa situação de assalto
(sempre há exceções).
A Revista Veja usou de
ironia ao usar o logotipo do Instituto Sou da Paz e mentiu quando em sua capa e
na página 79 mostra somente armas de uso restrito das forças armadas
possibilitando a leitura de que somos ou seríamos ameaçados por essas armas no
dia-a-dia. As armas que mais assustam e destroem hoje são revólveres calibre 38
e pistolas.
Falhou ao falar do
desarmamento envolvendo Hitler. Uma boa aula de História ou Sociologia teria
resolvido o problema. Esperamos que até o Referendo as pessoas estejam bem
informadas porque sem informação não se produz conhecimento. Pense em ser
"sim", respirar "sim", viver "sim" e em votar
"sim", pois este movimento de desarmamento surgiu com as ONGs que
atenderam o clamor das vítimas da violência.
(Texto publicado no
caderno Cidades, 18 de outubro de 2005, jornal Folha da Região,
Araçatuba/SP).
Amarildo Brilhante é
professor, pós-graduando em Línguas e Práticas Pedagógicas em Comunicação e
Linguagem e coordenador da Campanha de Desarmamento pela ONG Rede Cidadania em
Araçatuba. E-mail: amarbrilha@ig.com.br
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